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A transição para ARM: uma visão interna da história e do futuro do Mac


Quando a Apple lançou o Macintosh em 1984, mudou toda a indústria da computação. Mas depois de Steve Jobs ter sido afastado da empresa, esta entrou numa espiral descendente, perdendo uma quota de mercado significativa para a concorrência da IBM, Microsoft e outros fabricantes de PC. O Mac estava em crise. Vale lembrar o discurso de Steve Job na WWDC 2005.

Vamos falar sobre transições. O Mac, em sua história, passou por duas grandes transições até agora. O primeiro – 68k para PowerPC. Essa transição aconteceu há cerca de dez anos, em meados dos anos 90. Eu não estava aqui na época, mas a equipe fez um ótimo trabalho com tudo que ouvi [risos na plateia]. E o PowerPC preparou a Apple para a próxima década; foi uma boa jogada.

A segunda grande transição, porém, foi ainda maior. E essa é a transição do OS 9 para o OS X que terminamos há alguns anos; no início desta década. Este foi um transplante de cérebro. Embora esses sistemas operacionais variem apenas em um nome, eles estão em mundos diferentes em sua tecnologia. OS X é o sistema operacional mais avançado do planeta e preparou a Apple para os próximos vinte anos.

Hoje é hora de começar a terceira transição. Queremos constantemente fabricar os melhores computadores para você e para o restante de nossos usuários. E então é hora de uma terceira transição, e sim, é verdade. Vamos iniciar a transição dos processadores PowerPC para processadores Intel. – Steve Jobs, WWDC 2005

A Apple estava na posição mais difícil de todos os tempos; a empresa estava a meses de falência. O conselho de administração da Apple, em grande parte o mesmo da era Steve Jobs, teve que descobrir como salvar a empresa.

Agora, mais de vinte anos depois, a Apple precisa salvar o Mac novamente.

A Transição Quatro está sobre nós.

Transição I: 68k para PowerPC

O Mac estava em crise. Embora o Macintosh tenha provado ser revolucionário, o tempo e a concorrência não foram bons para a Apple. O Windows da Microsoft conquistou rapidamente participação de mercado devido à sua natureza “aberta”, que permitia a qualquer fabricante usar a plataforma mediante o pagamento de uma taxa de licenciamento. A Apple manteve com sucesso as vendas de Mac com software de editoração eletrônica, no entanto, o lançamento do Windows 3.0 e do Windows 95 provou ser catastrófico para a outrora visionária empresa de computadores.

A linha de produtos da Apple na época tornou-se incrivelmente complicada e permaneceu notavelmente mais cara em comparação com a concorrência. Para competir com os lançamentos recentes do Windows, a Apple lançou o Mac OS 7, que introduziu memória virtual e maiores capacidades multitarefa. No entanto, também foi construído para lidar com uma arquitetura de sistema mais avançada. A Apple começou a investigar uma alternativa aos seus chips de 68k e foi abordada pela Intel. A Intel rapidamente assumiu o controle da indústria de PCs com sua arquitetura de “computador com conjunto de instruções complexas” e processo de fabricação exclusivo de ponta a ponta. A Apple, no entanto, estava preocupada em ter uma arquitetura compartilhada com computadores Windows e em dar toda a participação de mercado a uma única empresa, e também suspeitava que os chips CISC da Intel seriam incapazes de competir com a próxima arquitetura de “computador com conjunto de instruções reduzido” da Motorola.

Em 1991, Apple, IBM e Motorola criaram a ‘aliança AIM’. O presidente da IBM, Jack Kuehler, estava convencido de que uma parceria comercial com a Apple era necessária para competir com a monção de OEMs do Windows, e a Apple não estava em posição de recusar tais oportunidades. Embora a aliança tenha sido um fracasso, ela resultou na criação do processador PowerPC Motorola, que o OS 7 foi desenvolvido para suportar. Isso levou a uma década de máquinas Apple rodando exclusivamente chips PowerPC, enquanto a Intel continuava a inovar anualmente.

Devoluções de empregos

A transição para o PowerPC não acabou impulsionando os números de vendas, e a aliança AIM fez pouco para ajudar a Apple ou a IBM a crescer. Isso fez com que a Apple caísse em uma espiral de desordem; desde a remoção de Steve Jobs em 1995, a empresa se viu dominada pela imagem não inovadora que antes detestava.

Steve, por outro lado, estava indo muito bem. Após ser afastado da empresa que fundou, ele tirou uma folga antes de financiar dois empreendimentos. O primeiro foi a Pixar, o agora lendário estúdio de cinema que Jobs adquiriu de George Lucas por US$25 milhões, e o primeiro filme de animação por computador Toy Story. O segundo foi o NeXT.

A NeXT pretendia fabricar estações de trabalho de última geração para o mercado educacional, algumas das quais foram as primeiras a incluir tecnologias revolucionárias, como uma unidade de disco óptico. Apesar de suas capacidades, as vendas de hardware foram fracas. A empresa parou de vender máquinas em 1993, porém, continuou trabalhando no sistema operacional NeXTSTEP. O sistema operacional foi baseado em uma implementação do UNIX e foi construído sobre a linguagem Objective-C.  Essa base deu ao NeXTSTEP a capacidade de ser muito mais avançado do que qualquer sistema operacional anterior voltado para o consumidor.

Em 1996, a Apple decidiu que era incapaz de desenvolver novamente o Mac OS a um nível necessário para competir com o Windows. O conselho de administração começou a procurar aquisições para resolver o problema, e a NeXT era o alvo principal. Em fevereiro daquele ano, a empresa anunciou que iria adquirir a NeXT por US$427 milhões.

O CEO da Apple na época, Gil Amelio, era um idiota. Ele fez uma série de declarações notoriamente ruins e pouco fez para ajudar a resolver os problemas financeiros da Apple. Naquele mês de julho, Jobs convenceu o conselho a destituir Amelio. Em setembro, Steve assumiria o cargo de CEO interino.

O cessar-fogo da Microsoft

Microsoft e Apple tornaram-se inimigas notórias desde o lançamento do Microsoft Windows. Na época, Jobs sentiu que Bill Gates havia roubado a interface gráfica do usuário da Apple depois de lhe mostrar uma demonstração no início dos anos 80. A Apple licenciou elementos da GUI do Mac para Windows 1.0, mas a Apple argumentou que a Microsoft começou a copiar os recursos do Mac com o Windows 2.0. Isso resultou em um processo legal que durou anos e deixou as empresas discutindo nos tribunais.

Em 1992, a Apple pagou à San Fransisco Canyon Company para criar uma versão do Quicktime para Windows. Em 1993, a Intel contatou a mesma empresa e pediu-lhes que ajudassem a melhorar o desempenho do Windows Video Player. A Apple suspeitou que a empresa usou o código que criou enquanto estava sob contrato com a Microsoft e a Intel e processou as partes. Isso levou os tribunais a ordenarem uma ordem de restrição à Microsoft para parar de usar qualquer código envolvido no processo, e a empresa reverteu as alterações.

Mais tarde, foi revelado que durante esse período a batalha legal entre a Apple e a Microsoft atingiu um pico febril. A Apple acreditava ter encontrado provas inegáveis de que a Microsoft havia roubado milhões de linhas de código do Mac OS, enquanto Bill Gates ameaçou interromper o suporte do Office no Mac se um novo processo fosse aberto.

Na MacWorld Expo, em janeiro de 1997, Jobs fez suas primeiras grandes mudanças na Apple em sua tentativa de consertar a empresa. Primeiro, substituiu quase todo o conselho de administração, tornando-se presidente. Em segundo lugar, e mais notavelmente, um acordo com a Microsoft. O acordo encerrou todas as batalhas legais, deu às empresas licenciamento cruzado de patentes, trouxe o Internet Explorer e o Office de volta ao Mac e fez com que a Microsoft investisse US$150 milhões em ações sem direito a voto da Apple.

Transição II: OS 9 para OS X

Logo após assumir o controle da Apple, Jobs revelou o iMac. Revelado em 1998, o PC foi o maior lançamento de produto da empresa desde o Macintosh original. O dispositivo era tudo-em-um e apresentava caixas translúcidas coloridas que podiam ser facilmente movidas usando uma alça embutida. O dispositivo era em grande parte a personificação das ambições originais de Jobs na NeXT.

Em 2000, a Apple apresentou formalmente o OS X, o novo sistema operacional Mac construído sobre o NeXTSTEP. A Apple começou lentamente a distribuir a atualização para os dispositivos e, no final de 2003, todos os Macs eram enviados com o OS X pré-instalado. Quando foi lançado aos consumidores em 2001, as críticas eram ruins. Embora o projeto fosse ambicioso, o sistema operacional funcionava horrivelmente no hardware Mac atual. Alguns desenvolvedores populares de Mac inicialmente se recusaram a oferecer suporte à atualização.

A Apple iniciou um rápido ciclo de atualização para o OS X, com lançamentos anuais disponíveis em todos os hardwares. Quando o OS 10.4 Tiger foi lançado em 2005, os executivos da Microsoft ficaram perplexos com a rapidez com que o sistema operacional se tornou um concorrente.

Ao longo deste período, a Apple continuou a simplificar e atualizar a sua linha de hardware. Steve Jobs introduziu uma nova estratégia de produto, sugerindo que a empresa deveria ter apenas quatro linhas de produtos: desktop de consumo, laptop de consumo, desktop profissional e laptop profissional. A Apple lançou vários dispositivos de sucesso, incluindo o PowerBook e o Mac mini.

Transição III: PowerPC para Intel

Na WWDC 2005, Steve Jobs fez um anúncio chocante. A empresa não apenas iria começar a transição do PowerPC para processadores Intel, mas também vinha co-compilando secretamente o Mac OS X desde seu início para rodar em chips Intel. Isso significava que a Apple não precisaria de um novo sistema operacional para suportar a mudança de arquitetura e, de fato, criou um produto de inicialização dupla voltado para o consumidor.

A Apple desenvolveu o Rosetta, uma ferramenta para executar aplicativos baseados em PowerPC em chips Intel. Isso permitiu que os usuários usassem todos os softwares Mac, independentemente do suporte do desenvolvedor. Em 2007, a Apple atualizou completamente a linha de Mac para rodar no mais recente chipset Intel. Além disso, um sistema baseado em Intel tornou teoricamente possível executar o Windows em hardware Mac. Isso se tornou realidade com o lançamento do Parallels Desktop em 2006 e do Boot Camp.

Embora a transição pareça fácil, a mudança foi uma das mais importantes na história da indústria. Bill Gates foi citado como tendo dito que essa foi a maior conquista técnica de Jobs. Ao oferecer suporte aos chips Intel mais recentes, a Apple conseguiu competir do ponto de vista de potência com a concorrência do Windows e começou a reduzir os preços. A empresa lançou dispositivos como o MacBook, MacBook Pro e MacBook Air e lentamente começou a recuperar participação de mercado.

iPhone e a era pós-PC

Em 9 de janeiro de 2007, a Apple fez seu maior anúncio até então: o iPhone. O dispositivo apresentava uma nova tecnologia chamada multitoque e foi acoplado a uma nova versão móvel do OS X.

Embora os detalhes exatos não estivessem claros na época, o iPhone foi construído sobre a mesma base UNIX do OS X e, portanto, permitiu que o dispositivo interagisse bem com dispositivos Mac com o passar do tempo. O sistema operacional acabou sendo reidentificado como iPhone OS e depois iOS. Recursos como Handoff são possíveis devido à intercompatibilidade dos dois sistemas operacionais.

Em abril de 2010, a Apple lançou o iPad, um tablet baseado no iPhone OS com multitoque. Embora a Apple já estivesse trabalhando no dispositivo há muitos anos e tivesse variantes rodando Mac OS, Jobs acabou descobrindo que o dispositivo era mais adequado para iOS.

O lançamento desses e de outros dispositivos inaugurou a era pós-PC; um tempo há muito previsto em que os PCs não são o centro da vida digital dos consumidores. Com essa mudança, no entanto, também surgiu um cisma entre o Mac e todos os outros dispositivos da Apple. Com o passar do tempo, a Apple continua a revelar dispositivos que executam variantes do iOS, incluindo Apple Watch, Apple TV, HomePod e outros. Embora o núcleo UNIX do iOS e do macOS permaneça o mesmo, as diferenças arquitetônicas continuam a deixar uma lacuna cada vez maior entre as plataformas da Apple. Além disso, o sucesso de serviços iOS como a App Store não teve sucesso na plataforma Mac tradicional da empresa.

A Série A

Começando com o iPhone 4, a Apple começou a desenvolver internamente o chipset do iPhone. O primeiro chip desenvolvido pela Apple, o A4, foi promovido como um recurso do iPhone 4. Jobs sempre acreditou que a Apple criaria idealmente todos os aspectos de seus dispositivos, do software ao hardware, e isso ainda não era possível com o Mac devido à complexidade dos chips do processador do PC.

O iPhone, no entanto, era muito menos complexo, e a Apple lentamente começou a expandir sua série de chips em dispositivos iOS. Quando o Apple Watch foi lançado em 2014, a empresa revelou o S1, o primeiro sistema em um chip da empresa. O chip apresentava todas as necessidades de um computador, incluindo processador, RAM e armazenamento flash.

A Apple continuou a desenvolver sua criação de chips ao longo dos últimos anos. Os AirPods apresentam o chip H1 ou W1, que funciona tanto como um pequeno computador quanto para aprimorar os recursos Bluetooth. O próximo carregador sem fio AirPower da Apple usará um chip personalizado para gerenciar a distribuição de energia entre os dispositivos. Desde o lançamento do iPhone 7, a Apple vem produzindo chips GPU junto com chips CPU com sua série M-Line.

Em 2015, a Apple lançou o novo MacBook, o PC mais fino e leve da empresa. A máquina foi possível graças ao novo chipset core-M da Intel, que permitia que as máquinas funcionassem sem ventilador. Embora no papel parecesse que a Apple estava adotando novas tecnologias, a empresa planejava internamente usar o dispositivo como um trampolim para seu próprio chipset.

Marzipan

Nos últimos dois anos, a Apple planejou discretamente uma grande mudança estrutural em suas plataformas de hardware e software. Chamada internamente de Marzipan, a iniciativa realinhará todos os produtos da Apple em uma nova estrutura compartilhada para a próxima década de tecnologia.

Vimos o Marzipan pela primeira vez no início deste ano com o lançamento do Apple News, Voice Memos e Stock no macOS Mojave na WWDC em junho. Todos esses aplicativos aproveitam uma nova estrutura que estará disponível publicamente no próximo ano. A estrutura permite que os desenvolvedores de aplicativos iOS portem facilmente esses aplicativos para execução em hardware Mac e os ajustem para aproveitar as vantagens dos recursos e dispositivos de entrada do Mac.

A segunda grande mudança que chega ao Marzipan é uma nova estrutura de UI compartilhada para novos aplicativos, que permitirá que os aplicativos sejam hipoteticamente executados em todas as plataformas Apple, ao mesmo tempo em que possuem elementos que se ajustam à interface apropriada. Isso significa que um desenvolvedor pode ter uma base de código que ajuste adequadamente os elementos entre um Mac e uma Apple TV.

A terceira grande mudança é um sistema operacional redesenhado. Tanto o iOS quanto o macOS receberão grandes reformulações de interface no próximo ano. A Apple espera sincronizar as plataformas dentro de dois anos, lançando mudanças de recursos simultaneamente e introduzindo aplicativos multiplataforma e Siri.

A quarta grande mudança: a transição do Mac dos processadores baseados em Intel para os chips da série A da própria Apple.

Transição IV: Intel para Série A

A Apple planeja começar a transição de dispositivos Mac para chips da série A em 2020. A empresa está planejando apresentar a mudança primeiro no MacBook e em um novo Mac de baixo custo que será lançado ainda este ano. A Apple co-compila o macOS em seus próprios chips há mais de sete anos. A empresa espera implementar essa mudança em toda a linha de Mac até 2028.

Para realmente migrar da Intel, a Apple precisará de chips GPU para máquinas profissionais. A empresa supostamente possui chips da série A que funcionarão com GPUs tradicionais da AMD e Nvidia, bem como GPUs internas. A Apple não espera que as GPUs internas substituam as alternativas de terceiros por pelo menos meia década.

A Apple vem testando lentamente seus próprios chips em Macs há algum tempo. O TouchBar, introduzido no MacBook Pro 2016, usa um chip T1 especial que se comunica com o chip Intel e executa uma versão modificada do watchOS. O MacBook Pro e o iMac Pro 2018 da Apple apresentam um chip T2 para melhorar o desempenho além das capacidades dos chipsets Intel.

A mudança acabará por permitir uma linha harmoniosa de produtos da Apple. Com todos os aplicativos desenvolvidos para suportar a linha A, o Mac se tornará parte de uma base compartilhada. Essa mudança finalmente corrigirá a maior inconsistência na linha da Apple e abrirá caminho para o próximo grande sucesso da Apple: uma nova plataforma de computação baseada no mundo real usando realidade aumentada.

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